sábado, 2 de outubro de 2010

# Tentativa 3 - Continuação #

* 11 *


          Madame Sanges, atordoada com a fuga da menina, mal conseguiu vestir-se cuidadosamente como de costume. Rapidamente convocou o motorista para que a levasse com urgência até o subúrbio, a fim de comunicar Dinha do ocorrido e, no caminho, foi devorando uns biscoitos de nata para que o estômago, afligido por sua gastrite nervosa, não reclamasse tão cedo.
          Desde que a menina fôra embora, Dinha não conseguia comer ou descolar seus pensamentos dessa triste situação. Sabia que de nada adiantaria tentar encontrar Lara pois acreditava na determinação daquela garota e julgava que ela já estaria longe. Mas, ainda assim, não havia consolo que pudesse acalmar seu espírito. Sentada na porta de casa, Dinha passara a noite em claro, rezando um terço atrás do outro e pedindo à santa de sua devoção, que protegesse o destino da sua pequena.
          Aquele encontro era inesperado. Madame Sanges aparecia uma ou duas vezes ao ano apenas, no Natal e no Dia das Crianças. Quando Dinha avistou o carro clássico estacionando frente a sua porta, levantou-se e bateu a poeira do vestido. Colocou o terço no bolso do avental e aguardou os segundos passarem como se fossem horas. Eis que desenbarcava Madame Sanges, salto afundando na terra lameada, óculos escuros de aro brilhante refletiam a luz do sol.

- Antônia, pelo amor de Deus!

          Os olhos de Dinha, fartos de lágrimas, mostravam que estava angustiada por demais. Desesperada, achou que Madame Sanges vinha lhe trazer uma notícia gravíssima. Afinal, seu coração intuitivo, nunca lhe tinha mentido e, naquele exato momento, ele lhe dizia que Lara tinha morrido.
          Madame Sanges, vendo o estado de Dinha, aproximou-se quase correndo, apertou suas mãos junto as dela e tranquilizou-a.

- Lara passou a noite em casa, estava tudo bem. Mas hoje de manhã ela sumiu. E achei que você saberia para onde ela foi.
- Purque ocê num troxe ela aqui inda ontem?

          Madame Sanges, ofendida, largou as mãos da mulher, olhou bem fundo em seus olhos e, em tom mais grave, disse o que não deveria.

- Se ela saiu daqui, é porque aqui não queria ficar. Você acha que eu a traria de volta? Acha que só você é responsável por ela, hein?

          Com a voz embargada, Dinha respondeu a única coisa que poderia.

- Eu cuidei dessa minina como si fosse minha, cum todo o meu amor, cum tudo qui eu tinha. I agora ocê vem aqui, mi dizê di se responsávei?! Tudinho qui eu dei procê, quanu ocê era piquena, eu dei prá ela. As mesma coisa. Ocê acha qui eu ti criei mal? Foi o mesmo amor, os mesmo carinho! Agora si ocê veio inté aqui só prá pisá ni cima di mim, dizê que eu qui errei, ocê podi imbora agorinha. Si eu tenho pecado, os seu são maior ainda, ouviu?