quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O Fundo

Perplexa,
Percebia afogar-se
Na areia movediça
Da eterna perguntação.
Por que não experimentava
A leveza e plenitude
Da santa ignorância?
A toda hora e a todo custo
Vivia por respostas.
Então quase submersa,
Com a natureza em fúria
A devorar-lhe a carne crua,
Compreendeu um algo,
Que de tão grande,
Quase tirou-lhe o ar.
Era nas tripas
Que morava a vontade.
E por então isso bastava.
Tocou com a ponta dos dedos
O fundo, bem fundo...
Então o impulso
- de quem não quer morrer só -
Tomou conta de seu corpo e,
Devagar, começou a subir.
Não era preciso saber mais nada.


Princesa

Feito cachorro sem dono,
Esperava as migalhas debaixo da mesa.
Saciava o tanto de que precisava,
O pouco para que abrisse os olhos no dia seguinte.
Teimava em acreditar que era princesa,
Rainha de um banquete de gostosuras sem igual.
Carregava a vergonha amarga
De gostar menos de si do que de todo o resto.
Do que de todo mundo.

Cálculo

"Água mole em pedra dura tanto bate até que fura"
Sabedoria popular

Meu monolito particular. 
Dor condensada e só
Lateja na forma
Embrionária do rim.
Aciono o botão
"Desentupir Filtros"
Mas está quebrado
Desde a última década.
Os minerais sempre mortos
Ajuntaram-se todos
Para me assombrar
Com suas histórias
De corpos calcificados.
Um banho morno
- alívio imediato -
Bem poderia umedecer
Todo o meu dentro revirado.