Experimentos

Monólogo de Cecília 

Performance

Personagem: Cecília é mulher, jovem de 30 anos, veste roupa de noite, com brilhos. Sapatos com meia fina, colar de brilhante e flor vermelha no cabelo. Roupa íntima preta. Está bonita.

Cenário: No canto esquerdo, à frente, um espelho de pedestal. No fundo, à direita, uma escada aberta de alumínio bem alta. Na frente, centro-esquerdo, uma malha clara, estendida (puxada do teto ao chão) forma um triângulo. No centro, bem à frente, um cubo rosa.

:o:

(Foco na escada. Cecília sentada no topo da escada, de pernas cruzadas, olhar fixo na platéia, corpo firme).

- Gosto de poesia, gosto do gosto dela quando habita a minha boca e quando sai de mim, espalhando sabor por aí... gosto de dizer a poesia.

(Suspira. Desce 3 degraus. Pára)

- Dizer coisas bonitas, coisas da poesia, faz bem para a alma. A poesia é a alma do mundo.

(Termina de descer a escada. Luz corredor sai da ponta da escada. Foco da escada apaga. Cecília segue em linha reta pela luz, até a frente do palco).

- Os versos me lembram viagens, dores, tempo largo que demora a passar...

(Senta, desleixada no chão).

- E como eu corro, como a gente corre, sem saber onde vai parar! E o Drumond (ri deliciosamente) com seus deleites (em tom de recitar) “Casas entre bananeiras, mulheres entre laranjeiras, pomar, amor, cantar”.

(Tira os sapatos, com cuidado, enquanto fala).

- Odeio bananas, mas me parece que ficam tão bem as casas entre bananeiras; sombra e verde. E mulheres!

(Suspira de novo. Começa a descer a meia calça).

- Nós, mulheres, somos poema até no corpo! (observa atentamente as pernas)Redondilhas de nossas curvas, soneto de nossos desejos, reticências de nossas dores (o olho vai lacrimejando) e... alma! Ah... alma! Luta!

(Se levanta rápido, olhos rasos de lágrimas).

- Mas não quero falar de mim. (pausa longa de respiração). Dói. Vou falar de poesia. (nervosa consigo mesma). Mas se poesia é a alma de tudo, não há como falar dela sem falar da minha alma!

(Silêncio. Enxuga o rosto com as mãos. Pensativa. Vai até o espelho. Começa a tirar o colar e fala dura consigo).

- Olha aqui sua frouxa, se não consegue dizer poesia, não diga!

(Joga o colar no chão e olha para a platéia).

- Não há como falar de poesia, falar da alma, sem sentir. Não há como dizer as palavras sem passá-las pelos poros, por toda a pele, sem curti-las; sem refletir sobre o que realmente querem dizer. Desculpem. (desolada). Achei que poderia me isentar, falar sem me envolver.

(Vai até a malha estendida, dá a volta nela, passando a mão e sentindo o tecido. Enquanto isso, diz)

- Não falarei mais trechos de poesia nem direi mais dela como sendo a gênese da vida. Ficarei quieta. Se ela é alma, passa pelo meu olhar, que é janela do meu espírito.

(Tira a flor do cabelo, vai arrancando as pétalas enquanto anda vagarosamente até chegar ao cubo. Senta, em postura exuberante. Silêncio. Fica olhando para a platéia, atentamente, durante 1 minuto).

- Ah! (grita e levanta exaltada) Mas se ela é alma, está em mim por inteiro, não só no meu olhar! Está nos dedos (olha para as mãos que destruiram a flor, acaricia o caule que sobrou e guarda no seio, dentro do vestido), está na nuca (massageia o pescoço carinhosamente), no meu sexo (leva as mãos entre as pernas e sorri). Ah!(suspira e corre, em direção à malha, agarrando-a). Eu sou poesia! Eu faço poesia! Sou uma poeta que transborda!

(Corre até a escada, sobe 4 degraus, solta o vestido e fica de calcinha e sutiã. Canta forte, enquanto a luz vai baixando)

Manhã triste e cinza
Manhã morta,
Mãe morta
Poesia e ventre
Ventre e entranhas
Alma e entranhas
Manhã


Micro Ensaio sobre a Crise

O que sobrou?
O sonho distante, o desejo mais íntimo, a lembrança do futuro?
O que ficou de mim em mim?
Tantos papéis apagaram de vez a minha essência?

Desenterro minhas memórias e histórias a procura de pistas que possam recompor o espectro do que sou.
Não sou essa imagem, essas palavras; não sou as funções que fui assumindo durante. 
Não sou o que dizem e o que olham; será que ainda existo? 
Ou sobraram apenas as marcas, manias e fotografias?
Sou só mais um corpo perambulando sem vida própria?

Não pode ser! Deixei-me morrer!
Descuidada.
Cuidando de tudo e de todos, não dei-me conta.

A velha sabedoria popular fez-se exemplar. Em casa de ferreiro o espeto é de pau.


Sem Título

CANSADA
CANSAD
CANSA
CANS
CAN
CA
C
.

                                                                                       A
                     P     e                                                   d
D      e                               D
            S                                         A
                                                        ç          A

                                                                                                                                                      SÓzinha



07/04/2011


Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito. Estampido. Grito...

Gemido. Dor. Gemido. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor. Dor...Zunido do Rádio. Zunido da Televisão. Espalhafato. Horror.Silêncio. Omissão vergonhosa.



Isadora Adora

A - arroz, amarelinha, água do banho
B - balança, bibi, balão, boneca de pano
C - corre cotia, chocolate, cabana, carinho
D - dia de sol, descansar a tarde inteira
E - escola, espátula, escorregador,
F - festa, família, feriado e feira,
G - Geórgia, granola, giz, gira-gira que brilha,
H - helicóptero no céu
I - inventar histórias e músicas
J - jogar um jogo, jantar a mesa
L - Liliti, libélula, lembrar de princesas
M - Mné Mné, mar, mamadeira, melancia, massinha
N - noite, Ninho, neném, naninha
O - ovinhos de Páscoa
P - praia, pipoca, piscina, pé descalço, parque, passa anel
Q - quero isso, quero aquilo, queijinho
R - riscar a parede, risada, regador
S - sapo cururu, sabonete, Shrek, soninho
T - tinta, titia, tatame, tomate
U - uva, uva-passa, ursinho
V - ventilador
X - xixi no vaso
Z - zoológico, Zeca


A Menina que Dorme com as Estrelas

Ri, alma de criança.
Ama, cheia de esperanças no
Instante fulgáz que é a vida.
Sabe-se lá o que está por vir?!
Saudade grande que sinto de ti
Agora que és apenas lembrança.


Isadora Adora - Parte II

A - areia, aniversário, anjinho, amiguinhos
B - batom, Beatriz, bolacha, banho, barra de cereal
C - cachorro, correr, cozinhar, calcinha
D - damasco, dançar, desenhar, danoninho
E - estrelas, esconde-esconde, escovar o dente
F - fanta laranja, festa, fazenda, formiguinha
G - gira-gira, guti-guti, gelatina de limão
H - Horto, história
I - igreja
J - Joana e Joaninha, jogar pedrinhas
L - laranja, lua cheia, limpar com paninho
M - macarrão, música, moedas, mexerica, morena
N - não
O - ônibus, oração
P - pirulito, perfume, parque, piano, presente
Q - quarto, quintal
R - rolar na cama igual rocambole
S - surpresa, saci-pererê, samba-lelê, sapatinho
T - tesoura, terra, teclado, tonquinha
U - umbigo
V - verso, volante, vaquinha, varrer, vizinho
X - xeretar nos armários
Z - Zeca


Experiência Concreta

TODOS    TODOS    TODOS    TODOS
TODOS    TODOS    TODOS    TODOS
TODOS    TODOS    TODOS    TODOS
TODOS    TODOS    TODOS    TODOS
TODOS    TODOS    TODOS    TODOS
TODOS    TODOS    TODOS    TODOS            D
                                                                             E   S  L
                                                                                           O
                                                                                                C A
                                                                                                       D
                                                                                                       A         



Nova Experiência com a Poesia Concreta



Sem Título (Madalena)

Fedida, feiosa, doída,
Fodida essa vida sem par.
Estampada na mídia ardida
Minha cara lavada e sem ar.
Nem viram meus fartos cabelos
Cuidados com um bom xampu,
O foco estava em meus dedos,
Cortados, danados,
Mandando tomar no cú.

- Não sou lixo não!
- Eu não quero foto não!

Lava, lava, lava de novo
E o cheiro não vai embora;
Por debaixo das unhas, nos pelos,
É lixo, chorume, restos e esmola.

Noite, catação de carena, a lanterna iluminou seu destino: colar de ouro e jade que pagou o aluguel atrasado, o novo guarda-roupas, a conta da quitanda, o caixão e o próprio enterro.

"Morre, aos 29 anos, catadora de recicláveis do aterro da zona Sul, que insultou a mídia com gesto obsceno no último julho."
"Virose e desidratação vitimou Madalena da Silva Carmo, a catadora polêmica."

Fedida, feiosa, doída,
Fodida essa vida sem par.
Estampada na mídia ardida,
Minha cara lavada e sem ar.


Notas Impublicáveis sobre o Presente

Os pés, que tão poeticamente a levavam
Não passam de tenras bisnaguinhas.
O sono, dantes de enlevos e doce aura
Agora é como rocha, marido depois da trepada.
E as curvas, outrora em lânguida harmonia,
Descambaram ao desenho cômico de tanajura.
Os poros - transpiravam juventude e gozo -
Ficaram assim, num tom róseo oleoso.
Cabia tudo, desde sonhos até micro roupas.
Pensa que seria mesmo bom se pudesse andar nua
Exibindo seu umbigo saliente por aí,
Ou as pernas corajosas e pesadas como postes
Ou os peitos temporariamente 44 de veias latentes.
Move-se, no seu dentro, outra gente.
E por isso, a fala estúpida sobre sua beleza estética,
É mesmo estúpida.
Trata-se de força.
E isso basta.



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