Envolto em couro de dromedário,
Dois dedos nos pés, como o avestruz.
No peito batia um coração solitário,
Feito de glacê e coberto de alcaçuz.
Por fora, o corpo medonho e nojento...
Dono de um talho na fronte ovalada,
Deixava escorrer um azul sangrento
Que formava a poça onde descansava.
Mas por dentro, o monstro se desfazia
De tanta carência e falta de amor.
Desinformado, ele próprio nem sabia,
De sua beleza escondida no horror.
Todo tempo, imerso em feiúra e maldade,
Havia esquecido o menino que era...
Olhos desconfiados, em qualquer parte
De seu dorso roxo e enrugado de fera,
Fitavam, atônitos, nos outros o medo:
vastos espelhos do seu negado eu.
E comia-lhes até a ponta dos dedos
Para que não lhe tomassem o que era seu.
A noite a lua minguava e o mundo dormia
Enquanto o grotesco, coitado, chorava...
De pesadelos, lembranças e esquizofrenia;
De remorso, pavor, tristeza e dor calada.
Debaixo do céu, ele reinava soberano,
Sentado em seu trono de chifres de boi;
Mas ninguém sabia do seu único plano:
Proteger a memória de quem realmente foi.
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